sentir o ritmo
e mergulhar no cântico das águas
o grito
revela o paladar-líquido do orvalho-carne
moldura debruçada num cálice de música e palavras
I
na barranca
pintura de medo
perfume de lua
com tranças de árvore
teço um balanço
e bailo nas estrelas
a ciranda dos sonhos
II
com vestes estelares
dragões na cintura
as faces da lua
no peregrino dorso
n’aquarela
gritos
dilaceram
girassóis
III
o sexo grita
as dores do arco-íris
espasmo secular
gotas insanas
relevo sem tramas
IV
nas lágrimas
a face misturada
lava outras faces
o mar selvagem
se curva
escultura nua
crua de segredos
V
um punhal
onírico
tatua na
película
do
corpo
dezessete pedras
giram o castelo
nas
sandálias da lua
VI
o corpo suado
moldura d’água
bebe natureza
um aquário soluça
seu corpo deserto
VII
delírio prateado
protesto calado de uma gueixa
orquídea em máscara de orvalho
sentencia despedidas
(temporal de saquê)
VIII
cativos
em sonhos verdes
amaru e sade
em versos
cálix corpo
cálido convexo
guirlanda mítica
cantiga tênue
madrugada
nua
IX
procura o corpo dentro de si
em atos de selvageria
rasgam-se
sussurros
no oitavo dia semanal
a madrugada extasiada
banha-se no néctar uterino
da mãe-terra
X
fantasmas se entregam à noite
o dia beija
a face da madrugada
XI
os seus pecados
cavo pela metade
sem qualquer esforço
as sobras dos seus atos
deixo para o julgamento
da sua amada
isso
se ainda lhe restou alguma
XII
riacho da lua guerreira
peixe e fogo
na moldura
o dia no ventre
do centauro negro
flecha umedecida
na aurora boreal
XIII
cântico na órbita-azul
verbo de tambores
e silêncios
água na caça
de um sagitário
e labirintos
grito as melodias
do Vesúvio
esfinge semeia
o nono girassol
no relógio lunar
XIV
Âmago
ser libertino
mescla-se com líquido
em manhoso êxtase
o deleite compassa o desatino
tatuo um poema no seu dorso
manifesto silente de mistérios
a madrugada estimula tramas
estrelas brincam no espelho d’alma
orvalho
o paladar do amanhecer
são versos em papiro imaculado
XV
roçar arco-íris
com dedos cristalinos
sussurrar palavras extintas
no dicionário da floresta carnal
punhal aveludado
bálsamo em cicatriz azul
ingênuo instante
poema bilíngüe
modela nuvens de algodão
XVI
estrela marinha
aquário de vento
gota tecelã
suspensa
(olhos-tempestade)
o seio lunar
contorna o orvalho
pedra de fogo
lateja na aquarela-ventre
gênesis
XVII
no leito
silhueta
sol de lábios místicos
na porta
o som chama-me a bailar
reina-mulher
cavalga e alimenta
tatua seu mapa
neste peregrino
na barca-desejo
o suor da noite
sem estratégia
sem medo-amanhã
me entrego
ô caçadora!
Avalon
se desenha na seiva
navego
XVIII
mordo a noite
e os espelhos de luz – mulher
retalhos
de palavras carnívoras
no tempo de sombras
corpo
labirinto de meus olhos
a música do seu ventre
revela as portas da morte
abraço essa melodia
a seiva de uma estrela
e sinto a canção do silêncio
percorrer pelo corpo
um beijo
recebe a primeira gota de orvalho
me alimento do seu sorriso
oferta de sangue
Poema: José Geraldo Neres
Visitem a versão com ilustrações de Floriano Martins.
http://www.triplov.com/poesia/neres/Ambrosia/index.html
Visitem o link deste poema TRADUCCIÓN DE MARTA SPAGNUOLO
http://www.elfantasmadelaglorieta.com/15_jgneres.htm
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